20 março, 2008

Na cidade (continuação)

Primeira parte aqui.

Sexta-feira, 17h da tarde, ela volta a pé pra casa com um sorriso fácil que por qualquer motivo dava o ar da graça: uma vitrine de artesanatos, um bebê no carrinho, um cachorro pedindo atenção no portão e mais. Ela realmente tinha motivos para estar alegre, primeiro era verão (ela adora!), horário de verão (idem), tinha recebido uma promoção no emprego (+ aumento de salário), estava frequentando a academia (todos os dias), podia ver aquele fim de tarde lindo, seus pais estavam bem, e mil outras coisas que a gente só de dá conta e fica agradecendo sem parar quando estamos assim nessa maré boa.
Vinha com mil pensamentos na cabeça que nem percebeu que em frente ao seu portão tinha um carro estacionado e um homem encostado nele. Tarde demais, ela já estava muito perto do portão para disfarçar e pega assim de surpresa não conseguiu pensar em algo pra fazer, como fingir que não morava ali e passar reto, dar meia volta, ou qualquer coisa do tipo. Então resolveu encarar o moço e entrar rápido sem olhar pra trás. Mas assim que o fitou recebeu um sorriso como resposta.
- Oi, você que mora aqui?
- É. Respondeu perdida, tentando entender o que era tudo aquilo.
- Meu nome é Miguel. Deixo meu carro aqui em frente a sua casa todos os dias.
- Ah...tá. Desculpe eu vinha distraída e acabei me assustando quando vi você parado aqui.
- Desculpa eu não queria te assustar, desculpa mesmo. Queria só te dar isso aqui, como agradecimento pelo seu favor. E lhe entregou uma pequena caixa embrulhada.
- Nossa! Não precisava disso não! Imagina moço se preocupar com isso...Nossa até sem graça, desculpe mas eu não esperava e...realmente não precisa, absurdo eu nem uso minha garagem pode deixar o carro aqui sempre que quiser.
- Obrigada mesmo. Não sei se você gosta...
- Do quê? Ah! O presente, nem abri, que indelicadeza a minha...Ahhh, lógico que eu gosto! Chocolate! Amo! Poxa você acertou! Obrigada! Aliás, que mulher não gosta de chocolate ?
Pingos grandes e fortes começam a cair do céu anunciando mais uma daquelas típicas chuvas de verão no final da tarde, rápidas e pesadas.
Ela faz menção de abrir o portão e entrar correndo mas olha pra ele e não sabe se se despede ou o quê, ele faz dá um sobressalto como se fosse dar a volta no carro e entrar mas se volta rapidamente e olha pra ela com cara de "e agora?".
Ela num ímpeto o chama para entrar e corre pra dentro com a mão dentro da bolsa a procura das chaves.
Já na sala um olha pro outro, os dois meio sem graça com a situação.
- Nossa, esse tempo é doido mesmo heim?
- Você viu? E essa chuva vai ser daquelas, daqui a pouco tá tudo alagado por aí!
- É verdade, quero só vê a marginal como vai tá!
- Putz, você vai pegar a marginal? Você mora aonde?
- Moro em Caraucária(*), é perto, antes de Campinas.
- Nossa deve ser fogo pegar esse trânsito todo dia, heim? Mas senta, vou pegar alguma coisa pra gente beber, você gosta de suco de abacaxi?
- Gosto mas por favor não se preocupe comigo...
- Imagina, rápidinho...
O suco chegou e logo após o papo correu solto, um assunto puxou o outro, e outro, e quando eles perceberam seus estômagos estavam dando sinais que estavam vazios.
- Vou pedir uma pizza pra nós!
- Não, não! Não precisa não!
- Eu também estou morrendo de fome e só assim para eu comer uma pizza em casa sem ficar com remorso depois de jogar metade no lixo.
- É, morar sozinho tem dessas coisas. Tudo bem eu topo, pode pedir.
Pizza encomendada volta o papo.
- Eu hoje moro com um primo, divorciado recentemente, mas antes morava sozinho também.
- É? Homem deve sofrer mais pra se virar sozinho ?
- É, mas a gente aprende.
- E o que tem de legal lá em Caraucária?
- Não muita coisa, em termos de diversão, barzinhos essas coisas é bem ruim. O que compensa são as trilhas, cachoeiras que tem por lá.
- Cachoeira??? Nossa eu adoro cachoeira! Não sabia que tinha por essa região.
- Tem sim, e umas bem legais aliás...
A pizza chega mas o papo não termina...Quase uma hora depois:
- Desculpa Miguel, mas é que eu marquei de sair com meus amigos e logo, logo eu tenho que sair para me encontrar com eles, você me desculpa mas...
- Por favor, eu que meio sem noção hoje, nem perguntei nada pra você já fui ficando...
- Você gosta de dançar? Vamos marcar um dia para você ir com a gente!
- Onde que vocês vão?
- Numa danceteria lá em Pinheiros chamada "Só amanhã".
- Só amanhã??
- É! Ela ri. É que a música só pára lá pelas oito, nove horas da manhã.
- E você aguenta dançar até essa hora?
- Já consegui, mas geralmente a gente saí de lá umas cinco horas... Tomamos café numa padaria e voltamos pra casa mortinhos da silva.
- Bom, eu não sou muito de dançar não, mas vou em casa e vejo com o meu primo, se ele topar a gente volta hoje e vamos lá conhecer.
- Tá bom...vou anotar o endereço pra você.
Com o papelzinho na mão ele se despede.
- Tchau, quem sabe até mais tarde.
- Até.
Ela fica olhando o carro sair e pensa: será que ele vai vir mesmo? Sorrindo entra no banho e logo esse pensamento é substituído pelo: que roupa eu vou por?


(*)Cidade fictícia.

Cont.

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